O Papa: novas tecnologias, um dom de Deus, mas é necessária a “algor-ética”
Francisco não recebeu os participantes do congresso
por causa de uma “leve indisposição” que, desde quinta-feira (27/02), o levou a
mudar sua agenda de compromissos. A mensagem do Pontífice foi lida pelo
presidente da Pontifícia Academia para a Vida, dom Vincenzo Paglia.
“A “galáxia digital” e a “inteligência artificial”
estão no centro da mudança de época que estamos vivendo. A inovação digital diz
respeito a todos os aspectos da vida seja
pessoal seja social.”
É o que afirma o Papa Francisco em sua mensagem aos
participantes da plenária da Pontifícia Academia para a Vida, divulgada nesta sexta-feira
(28/02), lida pelo presidente do organismo vaticano, dom Vincenzo Paglia.
O Papa não recebeu os participantes por causa de
uma “leve indisposição” que, desde quinta-feira (27/02), o levou a mudar sua
agenda de compromissos. De fato, o pontífice não saudou pessoalmente as
personalidades presentes esta manhã, no Vaticano, como o presidente do
Parlamento europeu, o diretor-geral do Fundo das Nações Unidas para a
Agricultura e Alimentação (FAO), demais autoridades e personalidades do campo
da tecnologia informática que participaram do encontro “O bom algoritmo?
Inteligência artificial: ética, direito e saúde”.
Segundo o Papa, a inovação digital “incide em nossa
maneira de entender o mundo e também a nós mesmos. Está cada vez mais presente
nas atividades e decisões humanas, e está mudando o nosso modo de pensar e
agir. As decisões, mesmo as mais importantes, como as das áreas médica,
econômica ou social, são hoje o resultado da vontade humana e de uma série de
contribuições algorítmicas. O ato pessoal chega ao ponto de convergência
entre a contribuição propriamente humana e o cálculo automático, de modo que é
cada vez mais complexo entender seu objeto, prever seus efeitos, definir suas
responsabilidades”.
Tecnologias digitais e democracia
“No plano pessoal, a época digital muda a percepção
do espaço, tempo e corpo. Infunde um sentido de expansão de si que parece não
ter mais limites e a homologação se afirma como critério predominante de
agregação: reconhecer e apreciar a diferença se torna cada vez mais difícil.
No âmbito socioeconômico, os usuários são reduzidos a consumidores,
escravos de interesses privados concentrados nas mãos de poucos”, frisa o
Pontífice.
Para Francisco, “dos canais digitais
disseminados na internet, os algoritmos extraem dados que permitem controlar
hábitos mentais e relacionais, para fins comerciais ou políticos, geralmente
sem o nosso conhecimento. Essa assimetria, na qual poucos sabem tudo sobre nós,
enquanto nós nada sabemos sobre eles, entorpece o pensamento crítico e o
exercício consciente da liberdade".
“As desigualdades se ampliam demasiadamente, o
conhecimento e a riqueza se acumulam nas mãos de poucos, com sérios riscos para
as sociedades democráticas. Esses perigos não devem esconder o grande potencial
que as novas tecnologias nos oferecem. Estamos diante de um dom de Deus, ou
seja, um recurso que pode dar frutos para o bem.”
O Papa reconhece que as ciências biológicas se
beneficiam da “inteligência artificial”. “Esse desenvolvimento induz
mudanças profundas na maneira de interpretar e gerir os seres vivos e as
características da vida humana, que é nosso compromisso proteger e promover,
não apenas em sua dimensão biológica constitutiva, mas também em sua qualidade
biográfica irredutível.”
Ação educacional mais ampla
Francisco afirma na mensagem, “que não basta
educar simplesmente ao uso correto das novas tecnologias: não são
instrumentos neutros, pois plasmam o mundo e comprometem as consciências no
plano dos valores. É necessária uma ação educacional mais ampla e amadurecer
motivações fortes a fim de perseverar na busca do bem comum”.
Segundo o Pontífice, existe uma “dimensão política
na produção e uso da inteligência artificial que não é apenas distribuir seus
benefícios individuais e abstratamente funcionais. Em outras palavras: não
basta simplesmente nos confiar à sensibilidade moral de quem faz pesquisa e
projeta dispositivos e algoritmos. É preciso criar órgãos sociais
intermediários que representem a sensibilidade ética de usuários e educadores.”
Princípios da Doutrina Social da Igreja
“Na busca comum por esses objetivos”, sublinha o
Papa, “os princípios da Doutrina Social da Igreja oferecem uma
contribuição decisiva: dignidade da pessoa, justiça, subsidiariedade e solidariedade.
Expressam seu compromisso de se colocar a serviço de cada pessoa em sua
totalidade e de todas as pessoas, sem discriminação ou exclusão. Mas a
complexidade do mundo tecnológico exige uma elaboração ética mais articulada,
para tornar esse compromisso verdadeiramente incisivo”.
Francisco concluiu o texto, ressaltando que “a “algor-ética”,
ética algorítmica, “pode ser uma ponte para garantir que os princípios sejam
inscritos nas tecnologias digitais, através de um diálogo transdisciplinar
eficaz. Além disso, no encontro entre diferentes visões de mundo, os
direitos humanos são um importante ponto de convergência para a busca de um
terreno comum”.
Fonte: Vatican News
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